Manhã serena, cheia de terra molhada no odor.
Faz um frio húmido sobre o chão seco,
tudo lembra a chuva que vem,
e nesta hora que o sol se apronta,
vem o pastor,
Hoje tal como todos os dias, sempre por esta hora, vem de
camisola cor de rosa da Lacoste, guarda chuva, (porque vai chover?) um saco de plástico
com o farnel e calças velhas, castanhas e sujas.
Sempre à mesma hora de manhã passa aqui, sempre de tarde
volta (para casa?).
Sempre passa, olhar no chão, calado, a poucos metros de mim,
nunca bom dia ou boa tarde, noite, grunhido ou quer que seja.
Atravessa a estrada, salta a vedação com tudo o que carrega,
devagar, junto ao poste que é mais fácil, com uma paciência simples, pé na rede, alto sobre o farpado pula ao outro lado, sério, sólido,
não se revela triste, só calado, nunca resmungando.
Senhor pastor, hoje que vem de cor de rosa, cheire a terra
molhada, levante o nariz e veja.
Talvez não seja um pastor feliz,
que a falar verdade,
além de nos versos, nunca vi um que o fosse,
a falar verdade,
a merda de ovelha também cheira mal.